O primeiro capítulo de 'Ensaio da paixão' provoca um impacto enorme. Isaías conversa com Deus e perde a paciência: "O senhor não passa de um velho estúpido e cego! Pois fique aí, no seu paraíso morto, enquanto eu recrio a vida na Terra. E tem mais: não quero rebanho, mas solidão." Corta. A história é outra. E aí se entende que o pobre Isaías tem razão em estar nervoso. Ele é o anfitrião, a contragosto, de um rebanho constituído por toda a espécie de gente, com variadas nuances políticas, ideológicas, sexuais, artísticas... É na ilha em que ele mora, terra perdida no sul do Brasil, que todo ano acontece o ensaio da Paixão de Cristo. Um teatro sem atores, roteiro ou cenários profissionais. Sim, estamos nos anos 70 e suas loucas paixões: maconha, paz e amor, experiências novas, curtição, transa legal, barato total... A mulher, como sempre, procurando seu espaço ao sol. Em certo momento, uma das "atrizes" questiona: "Já repararam que a mulher não tem vez na Paixão? Ou é a Virgem ou a Madalena. Ou santa ou puta. Deviam fazer Cristo mulher, seria mais justo." Quase levou vaia, lógico.