ENTAO DANIELA

"Então Daniela", livro de poemas do poeta argentino Ignacio Uranga,
traz poemas que se podem ler em uma série quase interminável,
são poemas de amor. Modos raros de amor os que estão ditos,
ou melhor, escritos, ocupando pudicamente um cantinho de uma página
em branco. Quase parecem o contrário, sem ser necessariamente de
desamor embora pudessem ser, com uma inserção restritiva, de amor.
O que não importaria porque poemas de amor como eram os de
antigamente tinham algo de confessional e estes também, mas
contrariamente, omitem, estes aqui, o doce cantar dos apaixonados
ou o lastimoso lamento do abandonado. De modo que são poemas
de "não amor" e tampouco isso importa porque, me parece,
o que importa é o fluxo, nem sequer a declaração, que é o que
se esperava dos poemas de amor: de um a outro os versículos,
que bem poderiam ser também os poemas, se seguem sem seguir-se,
fazem um discurso que serpenteia, permanentemente roto, na
sintaxe desde já, não no sentido de que tenha uma continuidade
infinita da palavra que, por não poder estar só, se agrupa em enunciados. Bem poderiam ter sido enunciados harmônicos, como quer a poesia, sons harmoniosos, frases aveludadas, mas não, brota deles uma crispação que não está no que se diz mas na natureza da palavra em si, sempre distante, sempre assassina da coisa.