FIANDO PALHA, TECENDO OURO

Joan Gould classifica os contos de fadas como, "em sua maioria, histórias tradicionais femininas", e faz deles a matéria-prima deste livro que, com muito talento, envolve o leitor no mesmo clima de magia que fascina as crianças desde o primeiro contato com estas narrativas. Na primeira frase do livro, a autora lança a pergunta: "Qual é o seu conto de fadas favorito?" e afirma que, enquanto a maioria das mulheres responde "Cinderela", os homens parecem confusos na resposta. Isto porque os mitológicos personagens dos contos de fadas falam diretamente ao imaginário feminino, através de seus conflitos existenciais que simbolizam as diferentes fases da vida de uma mulher: as mudanças físicas da puberdade, a transformação da donzela em uma adulta procriadora, os conflitos com a figura dos pais e as idealizações do casamento. As vivências femininas do crescimento são essencialmente mais perturbadoras do que as masculinas e estes conflitos aparecem em situações dramáticas nos contos de fadas,como uma fuga impetuosa, uma situação de desabrigo na floresta, a busca desesperada de sobrevivência, a perda da mãe boa e o surgimento da mãe má, a indiferença paterna etc. As heroínas dos contos de fadas estão condenadas a viver situações de sofrimentos e privações para que possam forjar uma personalidade forte e capaz de sobreviver aos perigos lá de fora, numa simbologia da passagem da infância para a puberdade, da proteção do lar para os mistérios da vida. A riqueza da interpretação dos símbolos contidos nos contos de fadas garante uma leitura instigante e reveladora, como, por exemplo, o "sono" da Bela Adormecida ou da Branca de Neve, visto como um período de preparação para a profunda transformação que acontecerá na vida da menina, nomomento em que o homem/príncipe - que não dorme, que está sempre alerta, que não vivencia mudanças físicas tão radicais - surja para resgatá-la e apresentá-la a uma nova realidade.