MASTIGANDO BORBOLETAS

Pensando o tempo não como uma linha, mas como um novelo, esta obra nos apresenta um mundo em que objetos narram e reconfiguram nossa sensação do passado. Assim, vamos escutando a poesia depositada nas louças, em orelhas de livros – e também nos espaços entre os corpos, entre o corpo e as coisas, entre as coisas e os fins de tarde em que um menino chuta uma bola na direção do presente.
Pedro Abilio, em mastigando borboletas, nos apresenta um universo feito de muitas sensações tangíveis do presente, mesmo quando rememora ou faz voltas breves a imagens do passado. Assim, a sensação do tempo é enevoada e o presente se contamina do que passou, do que passa, do que está prestes a acontecer. Não por acaso, um poema diz que tem “algo por obras incompletas / rascunhos, linhas, pinturas sem acabamento / planos, não realizados, filmes queimados”. Ao permitir essas incompletudes, ou pequenas rachaduras entre as imagens, o livro convoca nossas próprias histórias, os vão das nossas narrativas cotidianas, por onde sempre escapa uma “coberta espalhada na cama” ou o som das juntas estalando pela manhã.