Editada pela primeira vez em 1887, 'A Relíquia' procura abandonar os pressupostos científicos da época e instaurar o domínio da imaginação crítica, a partir da célebre fórmula "Sobre a nudez forte da verdade, o manto diáfano da fantasia". Nasce daí a literatura fantasista ou alegórica, por meio do qual o autor inaugura o romance problematizador em Portugal: excedendo os limites da crítica social, 'A Relíquia' procura relativizar a noção de verdade absoluta, por meio da ironia, do humor, da paródia e da interdiscursividade. Ao conceber, em pleno século XIX, uma viagem de Portugal à Jerusalém com a missão específica de resgatar uma relíquia dos tempos de Cristo, Eça de Queirós promove uma hilariante sátira à idéia do absolutismo religioso, chegando a sugerir que os espertalhões que lucram com o comércio da fé só se explicam como conseqüência do excesso de crença, que acaba por se converter em perversão conceitual. Em seu relato de viagem, Teodorico Raposo compõe uma paródia da paixão de Cristo, colocando-o em paralelo com outros doutrinadores importantes no mundo contemporâneo e em seu tempo.