A importância da teoria política de Laclau e Mouff e reside no fato de que, talvez poucas vezes como nas primeiras duas décadas do presente século, as ordens políticas tenham se submetido a deslocamentos tão profundos, o caráter contingente da ordem social tenha se tornado tão visível e a política, tão relevante. Em nível macro, isto se faz evidente se observarmos os deslocamentos, cada vez mais profundos, da ordem política hegemônica do fi m do século passado. A partir do macro e de cima, essa ordem, fundada nos pilares da democracia liberal e do capitalismo de mercado e na hegemonia dos Estados Unidos como a única superpotência, tem sido posta em questão no presente século pelo ataque às Torres Gêmeas, pelo jihadismo, pela grande recessão, pelas crises da democracia liberal, pela ascensão da China e do capitalismo asiático de Estado e, no começo da terceira década do século, pela pandemia do COVID-19. E se observarmos a ordem hegemônica do micro e de baixo, nunca antes as identidades sociais foram tão fluidas e a sua inscrição hierárquica na ordem social tão posta em questão, tal como evidenciam os protestos sociais em países desenvolvidos e em vias de desenvolvimento, o surgimento de novas formas de representação e comunicação política e o alcance global de movimentos contestatórios tão diferentes, mas tão relacionados entre si, como os movimentos pela emergência climática, o “Me too” e o “Black Lives Matter”.